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Bookish by the sea

Bookish by the sea

Os últimos marinheiros, Filipa Melo

Cláudia, 07.10.22

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A vida vai agitada e não tem havido muito tempo ou energia para ler... 

Depois de quase 15 dias sem tocar no livro que tenha na cabeceira, decidi num impulso do feriado pegar num dos livros da coleção Retratos da Fundação Francisco Manuel dos Santos. Estes curtos livros (este tem apenas 70 páginas) querem "trazer aos leitores um olhar mais próximo sobre a realidade do país". É "Portugal contado e vivido, narrado por quem o viu - e vê - de perto", autodescreve-se na primeira página.

O meu fascínio pelo mar é talvez um dos meus traços de personalidade mais marcados (se ainda não tinham percebido pelo título do blogue eheh). Como escreve a autora logo na linha de abertura, "não olhes, que o mar chama"... a mim sempre chamou.

Por isso, e depois de ter começado a semana embarcada num navio (naquela que foi uma das minhas melhores experiências profissionais até ao momento), este livro chamou por mim quando voltei a casa. A minha expectativa era encontrar nas breves páginas um novo ritmo de leitura e histórias incríveis de quem faz do mar vida.

A premissa parecia incrível! A autora esteve a bordo de dois navios, um de pesca de arrastão e outro da marinha mercante, para acompanhar o quotidiano de quem ali trabalha e perceber o que distingue estes "últimos marinheiros" portugueses. O mote é lançado logo na epígrafe, uma citação fenomenal de Anacársis:

"Há três espécies de seres: os vivos, os mortos e os que andam no mar."

Infelizmente saí um pouco desiludida. 

Queria muito gostar deste livro, mas achei o texto incrivelmente difícil de acompanhar. Altamente desconexo, as ideias não fluem suavemente numa linha condutora discernível. Algumas até se repetem e por vezes dão-se saltos de pensamento que demoram alguns parágrafos a recuperar.

E, por vezes, deparamo-nos com passagens que tentam ser mais poéticas ou filosóficas, mas quase perdem o sentido.

Adicionalmente, o livro está cheio de jargão marítimo que dificulta consideravelmente a leitura para quem não está por dentro deste mundo.

Além disso, a autora faz questão de introduzir enormes citações de outros livros que fazem referência ao mar. Algumas destas são interessantes (e servem de dicas para futuras leituras), mas por vezes não acrescentam assim tanto e até retiram o ritmo ao texto ou parecem deslocadas.

Por fim, e essa será talvez a minha principal crítica a um livro que se propõe a ser um retrato de uma classe, há um enorme foco em personagens indivíduais. Em algumas passagens são-nos enumeradas as peculiaridades de certo mestre, contra-mestre, marinheiro, cozinheiro, etc. quase como se de uma lista de compras se tratasse. Sendo o livro tão curto, estas acabam por não serem desenvolvidas. Em oposição, os dados estatísticos que permitiriam fazer uma ponte destes indivíduos para o grupo mais abrangente são despejadas em densos parágrafos ou até numa única nota de rodapé que ocupa quase metade da página. 

 Ainda assim, a experiência não foi um total desperdício. Além de ter imediatamente pegado num outro livro, onde o mar também é um dos motivos principais, destacaram-se alguns dados bastantes interessantes, por exemplo:

  • sabiam que apenas 1% do mar já foi explorado e que este cobre 71% da superfície do planeta? Ou que quatro em cada cinco espécies de animais vivem no mar?
  • conhecem a história da frota branca portuguesa? ou quão realmente precária era a vida dos que embarcavam para norte em longas ausências para pescar bacalhau?

E também esta passagem:

Já bastante aqui se referiu o estranho apelo que o mar faz a certos homens, mas não se quer sugerir nenhum tipo de experiência mística ou transcendental. Provavelmente, acontece que o contacto com o mar suscita experiências físicas e estéticas tão fortes que acaba por se tornar mais emotivo e instintivo que racional. 

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